sexta-feira, 24 de outubro de 2014

Por causa da plebe votarei em Dilma


Sim, há tempos sofro de pessimismo compulsivo e desilusão crônica. Mais: desde o início da campanha eleitoral deste ano, assumo, convicto, que sou também um ressentido incorrigível quanto aos caminhos e atalhos escolhidos pelo partido dos trabalhadores nos últimos doze anos. Reconheço, com ressalvas, as mudanças ocorridas na vida econômica dos menos favorecidos e aponto dedo em riste, irritado, triste e frustrado, todas as falhas: da inexistência de um plano de educação real e eficiente à demasiada importância que se dá aos programas assistenciais e à sempre nefasta ideia de governabilidade sem critérios – subir em palanque com Fernando Collor é ainda mais vexatório do que soltar os cabelos e fazer campanha para Aécio. Ainda assim, confesso: por causa da plebe votarei em Dilma.

E a motivação para abrir mão do convicto voto nulo que milito nas ocasiões eleitorais, desde que me decepcionei com os primeiros quatro anos de Lula no poder, não tem traço algum no sentido de validar bolsa-família, cotas, Copa do Mundo ou programas sociais colocados em prática somente depois das manifestações de junho do ano passado. A plebe (muito além da dimensão socioeconômica, tornou-se um estado de espírito) me força, me obriga a votar em Dilma. Passarei por tal humilhação porque essa gente – mal educada (no sentido de sua formação intelectual) e dada a cabrestos nos moldes coloniais –, através do voto, elegeu a Câmara mais conservadora desde o golpe de 1964, de acordo com levantamento do Diap, o Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar.

Em números, o susto é maior e melhor explicitado: são 80 evangélicos; 70 ruralistas; e 20 com o pé nas forças armadas da pior estirpe de nosso país. Se entramos em detalhes, fica ainda mais transparente e estarrecedor: em São Paulo, os três mais votados foram Celso Russomano (herói das massas consumidoras), Tiririca e Marco Feliciano; no Rio de Janeiro, a contradição comum de analfabetos políticos se fez presente quando reelegeram Bolsonaro e Jean Willys. Com Dilma, mantém-se a tentativa de equilibrar os interesses e eles, os caretas, permanecem fortes. Com Aécio no poder, decerto, os caretas ganham poder.

Graças à festejada ignorância política de nossa plebe, o desequilíbrio de forças continuará gerando, obviamente, males que nem mesmo futuros junhos de 2013 darão jeito. De forma precisa, 74% da nossa legislação terá, nos próximos quatro anos, as inevitáveis marcas: a manutenção das mortes no campo, que nunca são notícia; a intransigência, pautada em mistificações pentecostais, para debater maconha e aborto como questões de saúde pública; o retrocesso que começa no desprezo a mudanças no código penal, passando pela negligência desavergonhada com as nossas escolas públicas, culminando na defesa da maioridade penal como forma de resolver o problema da criminalidade no país.

Creio que o ideal seria oxigenar a democracia, como disse Cristovam Buarque. Mas, o evidente nivelamento por baixo das opções que se apresentaram também me faz votar na Dilma: Aécio é o porta-voz de uma direita envelhecida e oligárquica (seu vice é o criminoso Aloysio Nunes e Marin, atual dono da CBF, seu principal cabo eleitoral); Eymael, Fidelix, Pastor Everaldo e o cômico e cínico Eduardo Jorge na incessante busca por cargos (típica ação de partidos nanicos); Luciana Genro fazendo crer coerência até no que é impossível democraticamente (por exemplo, regulamentar o uso de drogas deve passar, antes, pelo Congresso, qualquer ação presidencial, sem esse trâmite, soará ditadura); quando ainda havia Eduardo Campos, admito que via, com muita cautela, alguma perspectiva de algo novo, mas, aí, veio a Marina Silva; e os esquerdoides, aqueles que andam roucos de tanto ladrar, não merecem comentário algum.  

Sim, serei obrigado a votar e Dilma, virando a cara e tomado de vergonha por ser compatriota de uma gente que elegeu senador um sujeito que sofreu justo linchamento moral, via impeachment, por ser cidadão de um país que mitifica o outrora operário que, quando no mais alto posto de uma república, no Jornal Nacional, declarou, sem indignação e cínico como um tirano, que caixa dois, no Brasil, é prática comum dos partidos políticos.

Assim, desistam, petistas de ocasião: não farei uso de avatar da Dilma em rede social, nem compartilharei postagens com dados mais quantitativos do que qualitativos sobre as ações do governo para me contrapor a Aécio. Como modo de não ser confundido com essa esquerda festiva, pretendo mesmo evitar a cor vermelha (ou algo que se aproxime desta) nas minhas roupas no dia da eleição.